Segunda-feira, 31 de janeiro de 2005
Vanglória
Que glória há, poeta, em subordinar orações ao dom teu?
Vá embora.
Que te valem as horas de joelhos diante do Verbo e do Verso?
Que demora.
Qual objetivo te advém em adjetivos e advérbios?
Dê o fora.
Que tanto à musa imploras? Apavore as visões da idéia, a luz no breu.
Senta e chora.
Quem que te enganas a gana de ser o Oráculo das nações?
O vácuo que vigora nos corações crentes e ateus?
A vida é agora, decora as lições, poeta,
essa tola coroa te cora,
tua última coroa, que ironia, será mesmo a de Flora.
............Sem pressa a dama da foice te aguarda e agoura,
............mas não apavora a morte quem vive de fato,
............quem compartilha, partilha a trilha, povoa a ilha.
............Fostes feto e serás por certo feito fosfato.
............Por Júpiter, poeta, Saturno a tudo ainda devora.
............Mesmo que permaneça a tua arte
..... ......tua melhor parte
............não serão para ti o aqui e o agora.
............Que vida tem Aquiles depois da flecha?
............No Hades se encontra quem antes se encontrava no
Ágora
A vida é o lugar onde o Superhomem
cai do cavalo
anda sobre rodas
e morre morte inglória.
Toda glória para, poeta, é vã e evapora
Weider Weise
Na cultura antiga ocidental (greco-romana), a morte era explicada através de um belo mito. Saturno (para os gregos, Júpiter para os latinos), temia o cumprimento de uma profecia: Um de seus filhos o iria destruir. Para que se não cumprisse esse agouro, ele devorava aos filhos. Assim se explicava a ação do Tempo, seu fruto sobre o homem: a mortalidade.
Todo grande artista é ciente de haver em si o potencial de atingir a imortalidade através de sua arte - ou seja, ser lembrado posteriormente pelo fruto do seu engenho, mesmo séculos após sua partida. O poema aborda essa questão tentando demover do poeta a obsessão por perpetuar
seu pensamento.
Alguns detalhes interessantes:
1) Subordinar orações (orações subordinadas) - domínio da linguagem
2) Implorar ao Verbo (o Cristo - que venceu a morte) e ao Verso, a luta pela justa-forma
3) Aliteração de "advém - adjetivos e advérbios". A persistência do som realçando a idéia da persistência da idéia através da palavra
4) Tola coroa te cora - "A coroa da glória" - novamente aliteração - persistência do som realçando a ação da coroa no rosto do poeta que cora, envergonha.
5) Irônica Coroa de Flora - A coroa de flores que ganha o defunto.
6) A dama da foice - A morte
7) Não serão para ti o aqui e o agora: Os dêiticos aqui e agora configuram o enunciado e a instância do discurso. Significa que o poeta não estará vivo para pronunciar ou se comunicar ou saber ou não da sua glória. De que lhe vale então?
8) Aquiles queria a glória, mas morreu. Que vale ser lembrado? Morte é morte. No Hades se encontra (morto estão) os que se reuniam no Ágora (local grego onde vivia a filosofia e a arte)
9) Menção à ironia do SUPERHOMEM - o ator Christopher ter ficado tetraplégico após queda de um eqüino e ter morrido ao fim.
10) Ausência do ora no último verso para sublinhar que a glória de fato evapora, se acaba, some.
Há ainda uma bonita consideração: O Super-Homem, herói dos quadrinhos (e do cinema) é o mito moderno do vencedor, do herói, do remidor, do poderoso que desejamos ser todos. Há uma necessidade no ser humano de heróis. Aquiles foi o Super-Homem da época antiga, como Hércules, Sansão (para os judeus), etc. A grande ironia é que nos tempos modernos a vida
tenha escolhido pregar essa peça ao ator mundialmente conhecido como o Super-Homem e mostrado a dura realidade da fragilidade humana. E ter o ator se empenhado na pesquisa de possíveis curas para si e outros que compartilhavam do mesmo sofrimento. Prova maior que a COMPAIXÃO, ou seja, o SOFRER JUNTO, PADECER COM ALGUÉM ocorre de FATO quando ALGUÉM SOFRE. O SOFRIMENTO É A MAIOR FORÇA HUMANIZADORA. É A FORÇA QUE EMPURRA UMA TENDÊNCIA CARIDOSA, SOLIDÁRIA, LATENTE, QUE ESTÁ MORRENDO EM CADA UM DE NÓS NA MODERNIDADE DAS TREVAS QUE VIVEMOS.
Carlos Drummond de Andrade escreveu um belo poema sobre a UNIDADE DO MUNDO: O sofrimento. Esse poema consta no seu último livro de poemas inéditos publicado: Farewell, o adeus do poeta. Que embora viva através de sua poesia, que lhe importa agora?
Todo grande artista é ciente de haver em si o potencial de atingir a imortalidade através de sua arte - ou seja, ser lembrado posteriormente pelo fruto do seu engenho, mesmo séculos após sua partida. O poema aborda essa questão tentando demover do poeta a obsessão por perpetuar
seu pensamento.
Alguns detalhes interessantes:
1) Subordinar orações (orações subordinadas) - domínio da linguagem
2) Implorar ao Verbo (o Cristo - que venceu a morte) e ao Verso, a luta pela justa-forma
3) Aliteração de "advém - adjetivos e advérbios". A persistência do som realçando a idéia da persistência da idéia através da palavra
4) Tola coroa te cora - "A coroa da glória" - novamente aliteração - persistência do som realçando a ação da coroa no rosto do poeta que cora, envergonha.
5) Irônica Coroa de Flora - A coroa de flores que ganha o defunto.
6) A dama da foice - A morte
7) Não serão para ti o aqui e o agora: Os dêiticos aqui e agora configuram o enunciado e a instância do discurso. Significa que o poeta não estará vivo para pronunciar ou se comunicar ou saber ou não da sua glória. De que lhe vale então?
8) Aquiles queria a glória, mas morreu. Que vale ser lembrado? Morte é morte. No Hades se encontra (morto estão) os que se reuniam no Ágora (local grego onde vivia a filosofia e a arte)
9) Menção à ironia do SUPERHOMEM - o ator Christopher ter ficado tetraplégico após queda de um eqüino e ter morrido ao fim.
10) Ausência do ora no último verso para sublinhar que a glória de fato evapora, se acaba, some.
Há ainda uma bonita consideração: O Super-Homem, herói dos quadrinhos (e do cinema) é o mito moderno do vencedor, do herói, do remidor, do poderoso que desejamos ser todos. Há uma necessidade no ser humano de heróis. Aquiles foi o Super-Homem da época antiga, como Hércules, Sansão (para os judeus), etc. A grande ironia é que nos tempos modernos a vida
tenha escolhido pregar essa peça ao ator mundialmente conhecido como o Super-Homem e mostrado a dura realidade da fragilidade humana. E ter o ator se empenhado na pesquisa de possíveis curas para si e outros que compartilhavam do mesmo sofrimento. Prova maior que a COMPAIXÃO, ou seja, o SOFRER JUNTO, PADECER COM ALGUÉM ocorre de FATO quando ALGUÉM SOFRE. O SOFRIMENTO É A MAIOR FORÇA HUMANIZADORA. É A FORÇA QUE EMPURRA UMA TENDÊNCIA CARIDOSA, SOLIDÁRIA, LATENTE, QUE ESTÁ MORRENDO EM CADA UM DE NÓS NA MODERNIDADE DAS TREVAS QUE VIVEMOS.
Carlos Drummond de Andrade escreveu um belo poema sobre a UNIDADE DO MUNDO: O sofrimento. Esse poema consta no seu último livro de poemas inéditos publicado: Farewell, o adeus do poeta. Que embora viva através de sua poesia, que lhe importa agora?
UNIDADE
As plantas sofrem como nós sofremos.
Por que não sofreriam
se esta é a chave da unidade do mundo?
A flor sofre, tocada
por mão inconsciente.
Há uma queixa abafada
em sua docilidade.
A pedra é sofrimento
paralítico, eterno.
Não temos nós, animais,
sequer o privilégio de sofrer.
(Carlos Drummond de Andrade)
Não temos nós humanos, sequer o privilégio de sofrer. O que une o mundo, o que nos une enquanto seres humanos é o sofrimento. Schopenhauer diz que a Vontade que garante a vida, traz sofrimento e portanto VIVER É SOFRER e que apenas a ÉTICA, a SOLIDARIEDADE E o amor ao próximo (E ASSIM A ANULAÇÃO GRADATIVA DA GANÂNCIA DAS VONTADES PESSOAIS SUBPOSTAS À VONTADE DA HUMANIDADE) é que trará ao SER SERENIDADE, PAZ e FELICIDADE. O ator do HERÓI DO CAPITALISMO, o SuperHomem, foi ferido para auxiliar os feridos. Feito herói de fato pelo sofrimento. Sei de muitos que teriam se entregue ao nada, sem nada terem tentado. É na dificuldade que se revela o herói.
Weider Weise
