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  • Segunda-feira, 28 de fevereiro de 2005

    Só para raros: “O lobo e a navalha”

    É um poema escrito em homenagem ao “Lobo da Estepe” (Der Steppenwolf) do alemão Herman Hesse (ganhardor do prêmio Nobel de Literatura). Obra prima muito à frente do seu tempo, verdadeiro clássico da literatura mundial foi declarado por Thomas Mann de ser esse Hesse tão brilhante quanto o “Ulisses” de Joyce.

    Se o livro é para poucos, imagine um poema sobre o livro.

    Quem ainda não teve a oportunidade de ler o livro, não o faça. Ele é genial demais e por isso subverte as estruturas psíquicas do leitor. Ninguém consegue sair dessa leitura inócuo. Mas se a tua curiosidade do mundo e das artes for acima da média, fora de medidas, então leia-o. Devore-o. Releia. As múltiplas camadas do livro e a elaborada arquitetura E principalmente o privilégio de um poeta como o Herman tê-lo escrito em prosa, fazem dessa leitura uma viagem única dentro de nós mesmos.

    Eis o poema:

    O lobo e a navalha


    I
    O lobo que trago de estepe atraca-se às grades da tez.
    Atrai-me e me traga na espreita,
    me prega no amargo,
    na febre,
    nas presas estreitas que mordem
    a ordem perfeita.

    II
    Esse lobo de Hesse é o assombro,
    É o dolo sem dó é o embargo.

    É o instante implicante do estrondo.
    A boca ocasionando o rasgo.

    O uivo do lobo,
    cativo no globo da mente,
    é a adaga dormente que ruge,
    é a chaga, o logotipo que surge
    e logo se apaga.

    III
    O lobo é o canalha
    Que atrapalha minha vida asceta.

    Se incide sagaz contra minha saga,
    Na idade do lobo o lobo desperta.
    Tem essa fome urgente da navalha
    A navalha que me roça a pele
    a luminosa lâmina
    que à alma e ao ânimo encara
    que sem ferir já fere

    O lobo assusta aos outros
    se mostra fantasma, me rasga, me afasta

    Corre atrás de mim
    e eu entro pelas portas
    tortas da aorta

    O lobo ri e grita
    "se mata".


    IV
    Entro pela porta estreita
    entre o cômico e o trágico
    o palco do Teatro Mágico
    só para loucos
    só para poucos

    e por um pouco
    e por sorte
    encontro o pote
    com elas, com ele, com nós

    e a música sonata
    que jaz no jazz
    desata os laços dos pés
    e ela me ensina a dançar
    entre a musa, a música e o músico

    e após
    a sós
    no teatro mágico
    vemos a ingrata vida
    em peças de xadrez
    grata ao ópio, ao pó ímpio, aos prêmios de baco:
    vinho, riso e tabaco.


    V

    A navalha na mão brilha
    quer que eu rasgue a garganta
    apague a chama que à alma aquece.

    E tudo se esclarece num repente:

    Não sou um homem nem um lobo

    Sou um pouco de cada fogo que
    Sob o corpo me aquece

    Um instante antes da manhã
    Visito-me no espelho
    Sou ainda o jovem
    Sou ainda o velho
    A navalha na mão amanhece


    Então eu raspo do rosto
    os pelos do lobo
    que dentro de mim cresce

    Quem não ri de si de si se esquece

    Weider Weise