Segunda-feira, 06 de junho de 2005
Atração
No inverno
Aves de todo mundo migram
Atraídas para a parada
Movimentada
Na Avenida Paulista
Arcos-íris de borracha esticam-se
Contra o gris do casulo:
Coloridas fantasias in
Carros entopem a avenida
Aorta da cidade
Tanta alegria junto que causa
A parada
Cardíaca
A cidade em silêncio se orgulha junto
(Se é pra ser, que seja com orgulho e maior que os americanos)
Baco comovido
Ri como o diabo
Da biodiversidade do Homo sapiens
Exposta como diversão de zoológico:
Tem bexiga,
Algodão-doce,
Maçã do amor,
Namorados,
Vovó...
Olhe só:
Meninos de mãos dadas
Aos pais
Levando cata-ventos.
Famílias inteiras atentas
Ao vôo exótico de dois milhões de borboletas
Esquecendo-se que são vermes
Diante da casa das rosas
Turística
********
Um poema sobre a Parada Gay realizada em São Paulo em 2005, tornando-se a maior do(s sem) gênero(s). Algumas coisas nos chamaram a atenção. Primeiro o nome: Parada. O curioso é que a "parada" (sem movimento, estagnada) pelas fotos e reportagens foi bem movimentada - Dois milhões de pessoas compareceram.
O poema brinca com o fato de ser inverno e no inverno as aves migram para onde seja verão/primavera. Aqui se deu um efeito migratório contrário. É no inverno que os seres alados chegaram em São Paulo. Aproxima, porém, da idéia semiótica de haver cores, flores,
borboletas, etc - uma verdadeira primavera no meio do inverno paulista.
"Arco-Íris de borracha/contra o gris do casulo" são as bexigas coloridas formando arcos na avenida contra o cinza dos prédios, comparados ao casulo - lugar oprimido, sem cores, onde a transformação se dá. Complementa a estrofe os versos:
"Coloridas fantasias in
......................................vestem-se contra o rígido concreto"
Fantasias pode ser sonhos ou roupas de vestir. Coloridas faz lembrar "amizades coloridas" termo pejorativo de relacionamentos diferentes. A fantasia é in (está na moda) ou "investe-se" contra a rigidez, a inflexibilidade, o preconceito do "concreto", do real, da vida real e também dos prédios, do aglomerado urbano e sem cor.
O poeta compara a parada (que causou um grande congestionamento e ela própria, apesar da movimentação de alegria das pessoas, estava parada, por tanta gente, como um infarte, uma parada cardíaca). É ambígua a leitura. Se pode ler a partir da "Cardíaca/A cidade..." ou "...que
causa a parada/Cardíaca". Brinca do "orgulho" da cidade de possuir a maior parada gay do mundo. Esse orgulho é claro, é ironia do poeta, pois que de fato, não ocorre, para a maioria das pessoas (muitos dos 18 milhões que vivem na cidade) que se sentem um tanto constrangidos, sentimento semelhante que se encontra nas famílias tradicionais o fato de possuirem um homossexual na família. O poeta então brinca com a ironia sobre esse "orgulho".
O poeta traz um pouco de cultura e brinca com "Baco comovido/ri como o diabo". (Baco, deus da suruba, do oba-oba, da devassa, da alegria carnal) - Verso que faz um espelhamento sonoro entre os signos Baco/diabo e como/comovido e ainda com a expressão "rir como o diabo".
Mostrando que o deus "grecoromano" é o que viria a ser o promotor de culpa cristão - diabo. Demonstra também que o assunto do homossexualismo é tão antigo quanto o ser humano, ou quanto a questão de deuses. E que a parada é uma alusão às antigas festas bacanais, onde se celebravam os prazeres sensuais, sem preconceitos sociais ou sexuais, conforme os historiadores do período.
"Biodiversidade do Homo sapiens" é um achado - homossexuais são seres humanos, como dita o latim - Homo sapiens. A brincadeira de sermos também animais brinca com a tendência de se querer descobrir o "gen gay" e a cientificação que torna o assunto um circo de horrores, uma
ida ao zoológico. Brinca com o sentimento de animalização que se atribui aos homossexuais.
"Tem bexiga,
Algodão-doce,
Maçã do amor,
Namorados,
Vovó...
Olhe só:
Meninos de mãos dadas
Aos pais
Levando cata-ventos."
Aqui o poeta enumera coisas que se encontram no zoológico. A sequência termina em "Vovó..." e pode novamente causar diferentes leituras. Ou "Vovó é uma das coisas que tem, ou o menino chama a atenção da vovó: "Vovó...olhe só: meninos de mãos dadas aos pais, levando cata-ventos" Ou: "Meninos de mãos dadas, aos pais, levando cata-ventos". Novamente ambíguo.
"
Famílias inteiras atentas
Ao vôo exótico de dois milhões de borboletas
Esquecendo-se que são vermes
Diante da casa das rosas"
A casa das rosas é uma casa tombada como patrimônio da cidade na avenida paulista. É uma casa singela, delicada, muito bonita. Os dois milhões de borboletas são os 2 milhões de participantes.
Aqui uma ambiguidade linda: "Esquecendo-se que são vermes" pode se referir tanto à "Famílias inteiras atentas" ou aos "dois milhões de borboletas". No primeiro caso, as famílias que vão para criticar, sentindo-se superiores, e se esquecem que também são vermes, que um dia vão morrer e etc. Ou o sentimento de ser considerado um "verme", um ser desprezível, uma forma nojenta de vida, que é o estigma com que a sociedade trata aos homossexuais.
O poeta finaliza com a chave de ouro:
"............................Sexual
..................Atração
Turística"
"A atração sexual virando atração turística", no caso dos curiosos, das famílias, dos simpatizantes, etc. Ou a "Atração Turística virando atração sexual", para os gays que foram à parada e se sentiram atraídos por alguém e flertaram ou ficaram, etc. Novamente a ambiguidade planejada permite essas duas leituras.
Termino dizendo que o poeta manteve planejadamente a ambiguidade do poema, não se posicionando sobre o assunto. O poema aponta ser a favor ou contra o homossexualismo de acordo com a visão e posicionamento de cada leitura, de cada leitor.
O poema brinca com o fato de ser inverno e no inverno as aves migram para onde seja verão/primavera. Aqui se deu um efeito migratório contrário. É no inverno que os seres alados chegaram em São Paulo. Aproxima, porém, da idéia semiótica de haver cores, flores,
borboletas, etc - uma verdadeira primavera no meio do inverno paulista.
"Arco-Íris de borracha/contra o gris do casulo" são as bexigas coloridas formando arcos na avenida contra o cinza dos prédios, comparados ao casulo - lugar oprimido, sem cores, onde a transformação se dá. Complementa a estrofe os versos:
"Coloridas fantasias in
......................................vestem-se contra o rígido concreto"
Fantasias pode ser sonhos ou roupas de vestir. Coloridas faz lembrar "amizades coloridas" termo pejorativo de relacionamentos diferentes. A fantasia é in (está na moda) ou "investe-se" contra a rigidez, a inflexibilidade, o preconceito do "concreto", do real, da vida real e também dos prédios, do aglomerado urbano e sem cor.
O poeta compara a parada (que causou um grande congestionamento e ela própria, apesar da movimentação de alegria das pessoas, estava parada, por tanta gente, como um infarte, uma parada cardíaca). É ambígua a leitura. Se pode ler a partir da "Cardíaca/A cidade..." ou "...que
causa a parada/Cardíaca". Brinca do "orgulho" da cidade de possuir a maior parada gay do mundo. Esse orgulho é claro, é ironia do poeta, pois que de fato, não ocorre, para a maioria das pessoas (muitos dos 18 milhões que vivem na cidade) que se sentem um tanto constrangidos, sentimento semelhante que se encontra nas famílias tradicionais o fato de possuirem um homossexual na família. O poeta então brinca com a ironia sobre esse "orgulho".
O poeta traz um pouco de cultura e brinca com "Baco comovido/ri como o diabo". (Baco, deus da suruba, do oba-oba, da devassa, da alegria carnal) - Verso que faz um espelhamento sonoro entre os signos Baco/diabo e como/comovido e ainda com a expressão "rir como o diabo".
Mostrando que o deus "grecoromano" é o que viria a ser o promotor de culpa cristão - diabo. Demonstra também que o assunto do homossexualismo é tão antigo quanto o ser humano, ou quanto a questão de deuses. E que a parada é uma alusão às antigas festas bacanais, onde se celebravam os prazeres sensuais, sem preconceitos sociais ou sexuais, conforme os historiadores do período.
"Biodiversidade do Homo sapiens" é um achado - homossexuais são seres humanos, como dita o latim - Homo sapiens. A brincadeira de sermos também animais brinca com a tendência de se querer descobrir o "gen gay" e a cientificação que torna o assunto um circo de horrores, uma
ida ao zoológico. Brinca com o sentimento de animalização que se atribui aos homossexuais.
"Tem bexiga,
Algodão-doce,
Maçã do amor,
Namorados,
Vovó...
Olhe só:
Meninos de mãos dadas
Aos pais
Levando cata-ventos."
Aqui o poeta enumera coisas que se encontram no zoológico. A sequência termina em "Vovó..." e pode novamente causar diferentes leituras. Ou "Vovó é uma das coisas que tem, ou o menino chama a atenção da vovó: "Vovó...olhe só: meninos de mãos dadas aos pais, levando cata-ventos" Ou: "Meninos de mãos dadas, aos pais, levando cata-ventos". Novamente ambíguo.
"
Famílias inteiras atentas
Ao vôo exótico de dois milhões de borboletas
Esquecendo-se que são vermes
Diante da casa das rosas"
A casa das rosas é uma casa tombada como patrimônio da cidade na avenida paulista. É uma casa singela, delicada, muito bonita. Os dois milhões de borboletas são os 2 milhões de participantes.
Aqui uma ambiguidade linda: "Esquecendo-se que são vermes" pode se referir tanto à "Famílias inteiras atentas" ou aos "dois milhões de borboletas". No primeiro caso, as famílias que vão para criticar, sentindo-se superiores, e se esquecem que também são vermes, que um dia vão morrer e etc. Ou o sentimento de ser considerado um "verme", um ser desprezível, uma forma nojenta de vida, que é o estigma com que a sociedade trata aos homossexuais.
O poeta finaliza com a chave de ouro:
"............................Sexual
..................Atração
Turística"
"A atração sexual virando atração turística", no caso dos curiosos, das famílias, dos simpatizantes, etc. Ou a "Atração Turística virando atração sexual", para os gays que foram à parada e se sentiram atraídos por alguém e flertaram ou ficaram, etc. Novamente a ambiguidade planejada permite essas duas leituras.
Termino dizendo que o poeta manteve planejadamente a ambiguidade do poema, não se posicionando sobre o assunto. O poema aponta ser a favor ou contra o homossexualismo de acordo com a visão e posicionamento de cada leitura, de cada leitor.
